sexta-feira, 23 de março de 2012

E o mundo moderno, como seguirá?

Em homenagem ao mestre do humor e do humanísmo.


Cordialmente,


Vitor Lemes Castro


"Monólogo Mundo Moderno

E vamos falar do mundo, mundo moderno
marco malévolo
mesclando mentiras
modificando maneiras
mascarando maracutaias
majestoso manicômio.
Meu monólogo mostra
mentiras, mazelas, misérias, massacres
miscigenação
morticínio, maior maldade mundial!
Madrugada, matuto magro, macrocéfalo
mastiga média morna
monta matumbo malhado
munindo machado, martelo
mochila murcha
margeia mata maior.
Manhazinha move moinho
moendo macaxeira;
mandioca!
Meio-dia mata marreco;
manjar melhorzinho.
Meia-noite mima mulherzinha mimosa
Maria Morena
momento maravilha
motivação mútoa
mas monocórdia mesmice.
Muitos migram
mastilentos
maltrapilhos
morarão modestamente
malocas metropolitanas
mocambos miseráveis
menos moral
menos mantimentos
mais menosprezo.
Metade morre.
Mundo maligno
misturando mendigos maltratados
menores metralhados
militares mandões
meretrizes marafonas
mocinhas, meras meninas,
mariposas
mortificando-se moralmente
modestas moças maculadas
mercenárias mulheres marcadas.
Mundo medíocre.
Milionários montam mansões magníficas
melhor mármore
mobília mirabolante
máxima megalomania
mordomo, mercedez, motorista, mãos
magnatas manobrando milhões.
Mas maioria morre minguando!
Moradia meiágua, menos, marquise
Mundo maluco.
Máquina mortífera
Mundo moderno melhore
melhore mais
melhore muito
melhore mesmo!
Merecemos.
Maldito mundo moderno
mundinho merda!"




Francisco Anysio de Oliveira Paula Filho - Chico Anysio

segunda-feira, 24 de outubro de 2011

Acho que ainda podemos acreditar...

Segue acórdão em agravo de instrumento proferido pelo Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo.


PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA – SEÇÃO DE DIREITO PRIVADO
AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 1.001.412-0/0

COMARCA              - MARÍLIA

 AGRAVANTE          - I. G. R. G.
(REPRESENTADO POR SUA MÃE: E. A. R.)
  
AGRAVADO            - R. DA S. M. (NÃO CITADO)
   
V O T O Nº  5902

                                     Ementa: Agravo de instrumento  -  acidente de veículo  -  ação de indenização  -  decisão que nega os benefícios de gratuidade ao autor, por não ter provado que menino pobre é e por não ter peticionado por intermédio de advogado integrante do convênio OAB/PGE  -  inconformismo do demandante  -  faz jus aos benefícios da gratuidade de Justiça menino filho de marceneiro morto depois de atropelado na volta a pé do trabalho e que habitava castelo só de nome na periferia, sinais de evidente pobreza reforçados pelo fato de estar pedindo aquele u’a pensão de comer, de apenas um salário mínimo, assim demonstrando, para quem quer e consegue ver nas aplainadas entrelinhas da sua vida, que o que nela tem de sobra é a fome não saciada dos pobres  -  a circunstância de estar a parte pobre contando com defensor particular, longe de constituir um sinal de riqueza capaz de abalar os de evidente pobreza, antes revela um gesto de pureza do causídico; ademais, onde está escrito que pobre que se preza deve procurar somente os advogados dos pobres para defendê-lo ? Quiçá no livro grosso dos preconceitos...  -  recurso provido.

   
            O menor impúbere Isaias Gilberto Rodrigues Garcia, filho de marceneiro que morreu depois de ser atropelado por uma motocicleta na volta a pé do trabalho, fez-se representado pela mãe solteira e desempregada e por advogado que esta escolheu, para requerer em juízo, contra Rodrigo da Silva Messias, o autor do atropelamento fatal, pensão de um salário mínimo mais indenização do dano moral que sofreu (fls. 13/19).
           
            Pediu gratuidade para demandar, mas esta lhe foi negada por não ter provado que menino pobre é e por não ter peticionado por intermédio de advogado integrante do convênio OAB/PGE (fls. 20).

            Inconforma-se com isso, tirando o presente agravo de instrumento e dizendo que bastava, para ter sido havido como pobre, declarar-se tal; argumenta, ainda, que a sua pobreza avulta a partir da pequeneza da pensão pedida e da circunstância de habitar conjunto habitacional de periferia, quase uma favela.

            De plano antecipei-lhe a pretensão recursal (fls. 31 e Vº), nem tomando o cuidado, ora vejo, de fundamentar a antecipação.

            A Procuradoria Geral de Justiça opinou pelo provimento do recurso (fls. 34/37).

            É o relatório.

Que sorte a sua, menino, depois do azar de perder o pai e ter sido vitimado por um filho de coração duro  -  ou sem ele  -, com o indeferimento da gratuidade que você perseguia.

Um dedo de sorte apenas, é verdade, mas de sorte rara, que a loteria do distribuidor, perversa por natureza, não costuma proporcionar.

Fez caber a mim, com efeito, filho de marceneiro como você, a missão de reavaliar a sua fortuna.

Aquela para mim maior, aliás, pelo meu pai  -  por Deus ainda vivente e trabalhador  -  legada, olha-me agora.

É uma plaina manual feita por ele em pau-brasil, e que, aparentemente enfeitando o meu gabinete de trabalho, a rigor diuturnamente avisa quem sou, de onde vim e com que cuidado extremo, cuidado de artesão marceneiro, devo tratar as pessoas que me vêm a julgamento disfarçados de autos processuais, tantos são os que nestes vêem apenas papel repetido.

É uma plaina que faz lembrar, sobretudo, meus caros dias de menino, em que trabalhei com meu pai e tantos outros marceneiros como ele, derretendo cola coqueiro  -  que nem existe mais  -  num velho fogão a gravetos que nunca faltavam na oficina de marcenaria em que cresci; fogão cheiroso da queima da madeira e do pão com manteiga, ali tostado no paralelo da faina menina.

Desde esses dias, que você menino desafortunadamente não terá, eu hauri a certeza de que os marceneiros não são ricos não, de dinheiro ao menos.

São os marceneiros nesta terra até hoje, menino saiba, como aquele José, pai do menino Deus, que até o julgador singular deveria saber quem é.

O seu pai, menino, desses marceneiros era.

Foi atropelado na volta a pé do trabalho, o que, nesses dias em que qualquer um é motorizado, já é sinal de pobreza bastante.

E se tornava para descansar em casa posta no Conjunto Habitacional Monte Castelo, no castelo somente em nome habitava, sinal de pobreza exuberante.

Claro como a luz, igualmente, é o fato de que você, menino, no pedir pensão de apenas um salário mínimo, pede não mais que para comer.

Logo, para quem quer e consegue ver nas aplainadas entrelinhas da sua vida, o que você nela tem de sobra, menino, é a fome não saciada dos pobres.

Por conseguinte um deles é, e não deixa de sê-lo, saiba mais uma vez, nem por estar contando com defensor particular.

O ser filho de marceneiro me ensinou inclusive a não ver nesse detalhe um sinal de riqueza do cliente; antes e ao revés a nele divisar um gesto de pureza do causídico.

Tantas, deveras, foram as causas pobres que patrocinei quando advogava, em troca quase sempre de nada, ou, em certa feita, como me lembro com a boca cheia d’água, de um prato de alvas balas de coco, verba honorária em riqueza jamais superada pelo lúdico e inesquecível prazer que me proporcionou.

Ademais, onde está escrito que pobre que se preza deve procurar somente os advogados dos pobres para defendê-lo ?

Quiçá no livro grosso dos preconceitos...

Enfim, menino, tudo isso é para dizer que você merece sim a gratuidade, em razão da pobreza que, no seu caso, grita a plenos pulmões para quem quer e consegue ouvir.

Fica este seu agravo de instrumento então provido; mantida fica, agora com ares de definitiva, a antecipação da tutela recursal.

É como marceneiro voto.

PALMA BISSON
Relator Sorteado


Acho que ainda podemos acreditar!

Cordialmente,

Vitor Lemes Castro

sábado, 19 de março de 2011

CIDADE MARAVILHOSA: A BELEZA POÉTICA ACLARANDO NOSSA PRÓPRIA TRAGÉDIA

         Após muita insistência de nossos adoráveis familiares, minha esposa e eu fomos passar o Carnaval no Rio de Janeiro, em frente à Praia de Copacabana.
         
         Tinha me esquecido de quão maravilhosa é a cidade do Rio de Janeiro, fonte cristalina de belezas naturais e pura poesia.

            Durante nossa estadia, entre almoços, jantares e passeios, me lembrei diversas vezes de um profundo texto do escritor Nelson Rodrigues, texto este elaborado no início de sua carreira, quando contava com 17 (dezessete) anos de idade, publicado no jornal “A Manhã” em 07 de fevereiro de 1928.

            Com inabalável ordem de certeza, penso que a inspiração de Nelson Rodrigues para a feitura do texto foram as belas pedras que cercam a cidade maravilhosa, sobretudo o morro da Urca, início e fim de todo encantamento.

Sem rodeios, segue a íntegra de uma das melhores crônicas de Nelson Rodrigues, obra prima investigativa da alma humana.

É sempre hora de revermos nossas posturas.

Cordialmente,

Vitor Lemes Castro



A TRAGÉDIA DA PEDRA...

            Vai para quatro meses. Fora à praça Mauá, receber um velho amigo que chegava duma larga estadia na Europa. Minha carcaça aproou no cais, com meia hora de antecedência. Para matar a monotonia da espera, dispus-me a andar ao longo do paredão, onde ondas anêmicas vinham quebrar-se, com um ruído seco. Dei o primeiro, o segundo e talvez o terceiro passo. Ia dar o quarto, quando uma voz me deteve:
            - Pode dar-me o seu fogo?
            Voltei-me. Era um sujeito magro, esguio, de aparência miserável, avançava para mim, cambaleando.
            Estendi-lhe uma caixa de fósforos.
            Ele ascendeu a ponta do cigarro, que chupava, e ficou alguns instantes olhando a fumaça azul, que ascendia nos movimentos caprichosos, volúveis, coleantes, dum vôo incorreto e arbitrário. Depois, entregou-me os fósforos, agradeceu-me com a mão e preparou-se para ir embora. Creio não errar afirmando que o homenzinho chegou a afastar-se de mim uns dez passos. Chegado, porém, a essa distância, parou, hesitou alguns momentos, e, finalmente, decidindo-se gritou:
            - O senhor conhece?
            - Quem? – indaguei surpreendido.
            - A tragédia íntima da pedra?
            Como eu fizesse não, com a cabeça, ele aproximou-se e, numa risadinha nervosa, começou:
            - Eu já o esperava. Quase ninguém conhece. Só algumas organizações muito especiais podem compreendê-la.
            Só aqueles, como eu, que renegam tudo na vida e no mundo para entregar-se aos encantos ignorados duma vida exclusiva de contemplação.
            O senhor vive, com certeza, dominado pela mesma preocupação obcecante que domina, neste momento, o mundo inteiro: a preocupação do dinheiro. O homem moderno não se extasia mais com o radioso espetáculo duma manhã nascente, com o magnífico cenário de um fim de tarde, com a imponência maravilhosa duma grande montanha cujos picos, levados por uma ânsia insopitada de dominar o próprio infinito, parecem chocar com o azul maravilhoso dos céus que nos cobrem. Nem o extasia a serenidade grandiosa duma noite de cristal, nem a beleza gigantesca duma tempestade. O mar, essa inconstante esmeralda, sempre pronto a vibrar no conflito de vagas colossais, em cujas cristas raios explodem como imprecações de Deus, e a se estender, sereno e manso, em imóveis lençóis azuis, o mar, com seus doces e terríveis mistérios, com a sedução, com seus encantos ignorados, o mar, não lhes prende a atenção obcecada por interesses materiais. O homem moderno vive exclusivamente para o dinheiro. Todos os seus passos, as suas idéias, os seus gestos, suas atitudes têm infalivelmente, matematicamente, como objetivo a ânsia irreprimível de alargas suas posses financeiras. Não importa que não ganhe com isso a felicidade. Aliás, ele bem o sabe. Sabe que cada vez mais se distancia dela. Mas domina-o a nevrose do século, que é ganhar mais dinheiro e arranjar mais dinheiro. Essa ânsia universal já fez sentir seus efeitos. Desapareceram do mundo os heróis, os desinteressados, os bons, os apóstolos de idéias e de ideais. Quem tenha, hoje, um gesto que de relance pareça ou bom, ou nobre, ou desinteressado, ou heróico, está com vistas num interesse próprio, oculto, mas real. O deputado que se bate nos congressos pelo bem-estar e a felicidade e a comodidade do povo, o deputado que, na tribuna, com semblante convulso e largos gestos, convoca aos tiranos ao respeito pela autonomia, pelos direitos do povo vilipendiado, o deputado está com vistas na reeleição, que não roubará o subsídio opíparo e que manterá o seu prestígio, a sua importância na sociedade.
            O orador galhardo e cavalheiresco, que às praças públicas e maltrata com voz tonitruante, numa oração cheia de imagens e de cores rebrilhantes, o governo de prepotentes, o orador está pensando, enquanto expectora a linda fraseologia, na importância, na autoridade que terá junto às massas, o que importará numa cadeira de deputado dada pela soberania popular, ou numa magnífica espórtula oferecida pelo governo, temente da influência de sua vontade no seio do povo.
            Assim são todos. Todos só agem e se locomovem pelos interesses particulares.
            Mas, eu perguntei ao senhor se conhecia a tragédia íntima da pedra. Levado inesgotável de minha língua, ia deixando de parte o objeto de minha pergunta. O senhor, pelo que me disse, ignora o tormento da pedra. Não me admira essa ignorância. Quase ninguém a conhece. Ela só pode ser vista e compreendida por certas organizações muito especiais, organizações que no nosso tempo, perfeitamente, ser inculcadas de retardatárias. De fato, elas não passam de retardatárias. Em vez de aderirem ao vagalhão que leva a humanidade toda à conquista de mais e mais dinheiro, elas preferem ficar isoladas, fugidas, estranhas à psicologia universal. Um homem que se preocupa neste tempo com a natureza e suas belezas, um homem que vive numa vida contemplativa é apontado como louco, como idiota, como malandro. Mas, também ele tem como recompensa do escárnio, das inventivas de todos, os tesouros, as maravilhas, os encantos que ninguém vê e ele vê, os encantos que a natureza oferece ao deslumbramento dos que vivem só para ela e sua magnificência. É o que acontece comigo. Sou apontado como um louco, como idiota, riem-se de mim. Mal sabem eles que me rio deles e com mais ardor e mais razão. Enquanto eles se matam e se devoram mutuamente, eu vivo feliz, livre, contente. Veja esse exemplo: um rico e conceituado negociante da nossa praça olha uma montanha.
            O que vê? Uma montanha e nada mais.
            Eu olho essa mesma montanha. O que vejo? Uma montanha e mais: uma montanha e toda a alma da pedra, tecido por tecido, fibra por fibra, toda alma da pedra, essa alma que é tão humana ou mais humana do que a alma humana.
Vejo a montanha e toda a tragédia da pedra em seus lances de magnífica dramaticidade, em suas situações de estupenda emotividade. Em todos os dramas, melodramas, em todas as sangrentas tragédias da literatura de fascículos, não há uma tão terrível e impressionante como a da pedra. Basta olhar a estrutura colossal duma montanha, atentar nos seus talhos, nos seus sulcos, para aprender, na sua brutalidade, todo o drama.
Quando amanhece e o sol inunda na sua luz cromática um dos gigantes de granito, pasma-me que ninguém veja e compreenda a sua desgraça. É nessa hora que os sulcos profundos, os talhos, as rugas que lhe conturbam a euritmia dos traços, e são sinais de sofrimento cruciantes, nessa hora, todos eles aparecem numa evidência brutal. Basta olhá-los para se compreender que não são como dizem, simples acidentes geológicos, mas o índice duma existência atormentada e impiedosa, retalhada de angústias, de amarguras, de sofrimentos. De noite, quando as montanhas não são mais do que uma avalanche de trevas rolando pelos horizontes e poluindo a claridade de cristal do céu, eu galgo os cimos e lá do alto, com os ouvidos na alma da pedra, sinto-lhe todos os anseios, as vibrações, e minha compreensão de sua tragédia ganha mais intensidade. Parece-me que sua vida perpassa ante meus olhos, desde os primeiros passos. O sofrimento do começo manchou sua alegria de rainha, tendo aos pés o mundo e dominado o mundo, foi um ultraje feito ao seu prestígio e ao seu valor.
            Querendo um dia encostar os píncaros no azul do céu, precipitou-se num vôo de águia.
            Mais, em meio, o remígio foi retido violentamente.
            Teve consciência de sua fraqueza. Esse desastre retalhou o arcabouço liso e limpo de erosões, chanfros, reentrâncias.
            E, assim, se iniciou a formidável tragédia de sua vida.
            Mas, o amigo impacienta-se com essa história. Na verdade, tem razão. Quem se interessará pelo drama mudo, incompreendido e incomensurável da pedra? Ninguém! Portanto, agradecendo-lhe os fósforos, tiro-lhe o chapéu e dou o fora...

sexta-feira, 11 de fevereiro de 2011

UMA BRINCADEIRA MUITO SÉRIA

Hoje é minha primeira postagem neste veículo informativo.

Confesso que tenho muitas dificuldades no trato com as questões da informática, não sabendo sequer inserir estes escritos na página eletrônica ora visitada, necessitando, assim, do auxílio imprescindível de minha amada esposa Roberta.

Tenho em meu íntimo que este canal de informação se apresentará como determinada forma de “fuga” da exaustiva realidade jurídica que me cerca, iniciando uma fase mais profunda na seara de meus estudos de hermenêutica, filosofia e teoria geral do direito, sem prejuízo de considerações abstratas no que tange à jurisprudência pátria.

Com isso, inicio meu divertimento intelectual com a consignação de um poema que servirá como vetor no âmbito do compromisso ora assumido.

“Se você tivesse acreditado na minha brincadeira de dizer verdades
teria ouvido verdades que teimo em dizer brincando.
Falei muitas vezes como um palhaço,
mas jamais duvidei da sinceridade da platéia que sorria”

Charles Chaplin

Cordialmente,

Vitor Lemes Castro